21 de setembro de 2025
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Manifestações contra PEC da Blindagem e anistia de Bolsonaro mobilizam as ruas pelo Brasil

BBC – Atos contra a anistia e a PEC da Blindagem foram convocados neste domingo (21/9) em diversas capitais do país, como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Salvador, Recife, Belém e Porto Alegre.

A convocação ganhou peso com a participação de grandes artistas. Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil estão anunciados para cantar na manifestação marcada para a tarde, em Copacabana.

“A gente tem que ir pra rua, pra frente do Congresso, como já fizemos outras vezes”, convocou Caetano em suas redes sociais.

As manifestações ocorrem depois que a Câmara dos Deputados decidiu acelerar uma proposta de anistia, mas o impasse sobre qual pode ser o benefício para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros condenados por crimes contra a democracia continua.

Enquanto parlamentares bolsonaristas querem um amplo perdão que livre o ex-presidente da prisão e o libere para disputar a eleição de 2026, a esquerda resiste a qualquer suavização de sua condenação no Supremo Tribunal Federal (STF) por liderar uma tentativa de golpe de Estado.

É nesse contexto que o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) tenta reunir apoio para uma proposta intermediária, que reduza penas, em vez de perdoar crimes. No caso de Bolsonaro, ele foi condenado a mais de 27 anos de prisão.

Paulinho foi escolhido pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para ser o relator da proposta, ou seja, o responsável por redigir o texto final a ser votado, após negociação com outras lideranças políticas.

Ele ganhou esse papel por ter boa relação com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e um perfil mais independente no Congresso, não sendo aliado nem do campo bolsonarista, nem do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O relator já declarou que uma anistia ampla como deseja Bolsonaro e seus aliados “é impossível”. A ideia de apenas reduzir penas, sem perdoar crimes, tem o apoio do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).

Enquanto as negociações caminham nos bastidores, movimentos e artistas ligados à esquerda, como Anitta e Caetano Veloso, convocaram para domingo (22/9) atos em diversas cidades do país contra qualquer anistia.

A mobilização é impulsionada também pela reação à PEC da Blindagem, alteração da Constituição aprovada na Câmara para proteger parlamentares de processos criminais.

Pesquisas indicam que a maioria da população é contra a anistia, mas o apoio à proposta é significativo.

Segundo pesquisa Datafolha da última semana, 54% se opõem ao perdão para Bolsonaro, enquanto 39% apoiam a medida.

Já a aprovação da PEC da Blindagem na Câmara gerou forte reação nas redes sociais, da esquerda à direita.

Manifestantes seguram cartaz escrito "sem anistia" no Rio de Janeiro.
Câmara acelera proposta de anistia, mas o impasse sobre qual pode ser o benefício para Bolsonaro e outros condenados por crimes contra a democracia continua

As negociações de Paulinho da Força

Paulinho da Força cercado de jornalistas
Paulinho da Força deseja levar proposta à votação na quarta-feira

O relator da proposta iniciou a articulação para uma proposta intermediária na noite de quinta-feira (18/9), com um jantar em São Paulo com o ex-presidente Michel Temer (MDB) e o deputado Aécio Neves (PSDB-MG), ex-presidente da Câmara.

Durante essa reunião, Temer ligou para os ministros do STF Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, segundo Paulinho da Força contou ao portal Metrópoles.

Mendes é antigo amigo de Temer, enquanto Moraes foi indicado por ele para entrar no STF, em 2017, quando era seu ministro da Justiça.

Após essa reunião, o relator deu novas declarações na sexta-feira (20/9) reforçando o foco em uma proposta que apenas reduza punições.

“O projeto de lei que teve urgência aprovada não se tratava mais da anistia. Nós estamos tentando mudar o nome do PL, é um ‘PL da Dosimetria’. Ou seja, estamos tratando de um projeto de lei para reduzir penas”, disse à rádio CBN.

Esse caminho sofreria menos resistência no Supremo, enquanto a aprovação de uma ampla anistia no Congresso tende a ser considerada inconstitucional pela maioria da Corte.

Ao menos seis ministros do STF já se manifestaram em votos ou falas públicas contra a possibilidade de um perdão para crimes contra a democracia — Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.

Para o cientista político Rafael Cortez, da consultoria Tendências, a conjuntura política deve ajudar Paulinho a construir um acordo para aprovar uma alternativa mais branda à anistia.

“Acho que é uma escolha de um nome [para relator] que ficou distante do governo [Lula] e que enxerga nas mudanças potenciais em São Paulo, dado a possibilidade do projeto [presidenciável] do governador Tarcísio, uma oportunidade de aumentar capital eleitoral”.

“Esse movimento parece ser reflexo de uma parcela da elite política que, de fato, enxerga nessa conjuntura a possibilidade de retomar o protagonismo no campo antipetista, status que foi tomado pelo Bolsonaro”.

Paulinho falou também, na sexta-feira, que tem pressa para votar a proposta e que tentará que ela seja analisada pela Câmara na próxima quarta-feira (24/9).

Ao portal UOL, disse que fará nos próximos dias reuniões com governadores e as bancadas dos partidos na Câmara.

O relator já procurou governadores aliados de Bolsonaro, como o de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), o do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), o de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), e o de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo).

E está em diálogo também com o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), que mantém bom diálogo com Lula.

Seu objetivo é tentar que os governadores influenciem os deputados dos seus estados

Resistência maior no Senado?

Caso a proposta de alguma anistia ou redução de pena passe na Câmara, terá que ser aprovada também no Senado.

O presidente da Casa, Alcolumbre, tem se queixado das pressões do campo bolsonarista e se coloca contra uma “anistia ampla”.

Ele disse na quinta-feira já ter uma proposta alternativa pronta, mas não detalhou seu conteúdo.

“Vou esperar o que a Câmara vai decidir primeiro. O texto está pronto, mas vou esperar lá”, afirmou.

“Se não resolverem, na semana que vem eu vou tomar uma decisão”, continuou.

Alcolumbre, em sessão do Senado
Alcolumbre é contra anistia ampla, defendida por bolsonaristas

A expectativa é que o texto proponha apenas redução de penas. Não está claro, porém, se a versão de Alcolumbre contemplaria apenas envolvidos nos ataques de 8 de janeiro de 2023, sem beneficiar os condenados por liderar a tentativa golpista, como Bolsonaro.

A ideia tem sido criticada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).

“A anistia tem que ser pra todo mundo. Não dá pra anistiar a Débora do Batom sem anistiar também o Jair Bolsonaro. Sabe por quê? Porque eles estão respondendo pelos mesmos crimes”, disse, durante ato pela anistia no Rio de Janeiro, em 7 de setembro.

Já o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, fez duras críticas a Alcolumbre nesta sexta-feira e prometeu travar a pauta do Senado se Alcolumbre não colocar a proposta de anistia em votação.

Para isso, ele diz contar com o apoio da maioria do PSD, do PP, do Republicanos e do União Brasil, além do seu partido.

Valdemar falou ainda que o atual presidente do Senado não vai conseguir se reeleger no comando da Casa, caso não colabore com o andamento da anistia.

“Ele trabalha para o Supremo, ele não trabalha para o Senado, mas vai pagar caro por causa disso. Vai pagar caro, se ele não se comportar como um presidente do Senado tem que se comportar”, disse Valdemar, em entrevista à rádio Itatiaia.

Rafael Cortez, da Tendências, vê espaço para o Senado aprovar reduções de penas” talvez numa versão mais suave”.

“Acho que o governo vai tentar, contudo, manter o projeto sem referência ao núcleo decisório e mais para os ‘peixes pequenos'”, ressaltou.

Isso, porém, traz riscos para o governo, nota o cientista político, ao manter o impasse sobre a anistia. Ele ressalta que o governo está interessado em superar esse tema para que seu “pacote” reeleição ande no Congresso, como a proposta de elevar a isenção do Imposto de Renda para pessoas com ganhos de até R$ 5 mil ao mês.

“O que realmente vai contar [para aprovar algum benefício aos condenados] é se o bolsonarismo aceita versão light e se o governo está disposto a pagar a conta para ter o pacote de reeleição”, reforça.

Em entrevista exclusiva à BBC na quarta-feira, Lula afirmou que vetaria uma proposta de anistia. Projetos de lei precisam ser sancionados ou vetados pelo presidente, mas o Congresso também pode derrubar um eventual veto.

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