18 de outubro de 2025
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Barroso vota a favor da descriminalização do aborto

Revista Fórum – “Direitos fundamentais não podem depender da vontade das maiorias políticas”, disse o ministro em seu voto.

Logo após o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, ter aberto sessão no plenário virtual da Corte sobre a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, que trata da descriminalização do aborto até a 12º semana de gestação, o ministro Luís Roberto Barroso colocou no sistema o seu voto favorável à ação.

“Ninguém é a favor do aborto em si. O papel do Estado e da sociedade é o de evitar que ele aconteça, dando educação sexual, distribuindo contraceptivos e amparando a mulher que deseje ter o filho e esteja em circunstâncias adversas. Deixo isso bem claro para quem queira, em boa-fé, entender do que se trata verdadeiramente”, diz o ministro no início de seu voto.” A discussão real não está em ser contra ou a favor do aborto. É definir se a mulher que passa por esse infortúnio deve ser presa.”

Barroso havia pedido ao presidente da Corte a convocação de uma sessão extraordinária no plenário virtual para dar continuidade ao julgamento e poder votar sobre o tema. Até agora, além do voto do ministro, apenas a ex-ministra e relatora Rosa Weber expôs seu posicionamento, também favorável à ação.

Questão de saúde pública

Em seu voto, Barroso pontua que “a interrupção da gestação deve ser tratada como uma questão de saúde pública, não de direito penal”. E cita pesquisas endossadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) documentando que a criminalização não diminui o número de abortos, mas apenas impede que ele seja feito de forma segura.

“Vale dizer: a criminalização é uma política pública que não atinge o objetivo de reduzir o número de ocorrências. A maneira adequada de lidar com o tema é fazer com que o aborto seja raro, mas seguro”, defende. 

O ministro destacou ainda o fato de a punição afetar de forma distinta as mulheres. “A criminalização penaliza, sobretudo, as meninas e mulheres pobres, que não podem recorrer ao sistema público de saúde para obter informações, medicação ou procedimentos adequados. As pessoas com melhores condições financeiras podem atravessar a fronteira com o Uruguai, Colômbia, ir para a Europa ou valer-se de outros meios aos quais as classes média e alta têm acesso”, diz.

‘É possível ser contra o aborto e contra a criminalização’

Barroso ressaltou também que “praticamente nenhum país democrático e desenvolvido do mundo adota como política pública a criminalização da interrupção da gestação nas primeiras semanas”. “Isso inclui 39 países europeus e outros pelo globo, como Alemanha, Austrália, Canadá, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal e Reino Unido. Nos Estados Unidos, a Suprema Corte decidiu que cabe a cada Estado-membro da Federação decidir, sendo que a maioria deles permite”, pontuou. 

“As mulheres são seres livres e iguais, dotadas de autonomia, com autodeterminação para fazerem suas escolhas existenciais. Em suma: têm o direito fundamental à sua liberdade sexual e reprodutiva. Direitos fundamentais não podem depender da vontade das maiorias políticas. Ninguém duvide: se os homens engravidassem, aborto já não seria tratado como crime há muito tempo”, argumentou o ministro.

Ainda em seu voto, Barroso afirmou ter “profundo respeito pelo sentimento religioso das pessoas” e que, por isso, é “plenamente legítimo ter posição contrária ao aborto, não o praticar”. “Mas será que a regra de ouro, subjacente a ambas as tradições – tratar o próximo como desejaria ser tratado –, é mais bem cumprida atirando ao cárcere a mulher que passe por esse drama? Pessoalmente, entendo que não. Portanto, sem renunciar a qualquer convicção, é perfeitamente possível ser simultaneamente contra o aborto e contra a criminalização.”

“Em suma: numa sociedade aberta e democrática, alicerçada sobre a ideia de liberdade individual, não é incomum que ocorram desacordos morais razoáveis. Vale dizer: pessoas esclarecidas e bem-intencionadas têm posições diametralmente opostas. Nesses casos, o papel do Estado não é o de escolher um lado e excluir o outro, mas assegurar que cada um possa viver a sua própria convicção”, conclui Barroso.

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