28 de setembro de 2025
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Anistia a Bolsonaro “seria um desastre”, diz cientista político da Universidade de Nova York

DCM – Professor emérito da Universidade de Nova York, o cientista político polonês Adam Przeworski classificou a possibilidade anistia ao ex-presidente do Brasil Jair Bolsonaro (PL) como um desastre. Em entrevista ao Globo, Przeworski afirmou que o julgamento do líder da extrema-direita e de militares mostraram a força das instituições brasileiras:

Qual o significado do julgamento de Jair Bolsonaro para a democracia brasileira?

O que impressiona no julgamento não é apenas que Bolsonaro foi condenado, mas que oficiais militares de alto escalão também o foram. Isso é inédito no Brasil. E as Forças Armadas estão em silêncio. O julgamento mostra que Bolsonaro não sai impune, que a sua base potencial de apoio para desestabilizar a democracia foi desativada e que as Forças Armadas não vão desempenhar um papel político.

Bolsonaro foi condenado a 27 anos e 3 meses de prisão, mas a Câmara discute um projeto que pode livrá-lo de punição. O que significaria a anistia?

Seria um desastre. A lição de uma anistia seria clara: pode-se levar a cabo ações criminosas contra a democracia e sair impune. Encorajaria o próprio Bolsonaro e qualquer outro líder político a tentar isso.

A história da América Latina está repleta de golpes. A democracia brasileira se fortaleceu?

A democracia brasileira é muito forte. As instituições brasileiras são poderosas, e o veredicto contra Jair Bolsonaro confirma essa impressão. […]

Por que o governo Trump resolveu apoiar Bolsonaro via tarifaço?

Trump reage por instinto. Não creio que ele pense nas consequências. Ele fica irritado quando é derrotado, mas logo desiste e passa para outra coisa. Não acho que tenha uma grande estratégia para o Brasil. No passado, sim, os Estados Unidos agiram de forma clandestina. Apoiaram os militares (em 1964), mas tentavam esconder isso. Creio que este tipo de ação aberta, não premeditada e despreparada por parte de Trump não vai levar a nada.

O ministro Luiz Fux citou o senhor no voto em que defendeu a absolvição do Bolsonaro. O que achou?

Li o voto, mas não posso julgar se faz sentido do ponto de vista jurídico. Quando ele invoca a ciência política, não consigo ver quais conclusões o ministro Fux desejou extrair. É verdade que acadêmicos definiram a democracia de maneiras distintas. Isso justifica as ações de Bolsonaro? Isso implica que ele não tentou um autogolpe?

O ministro Fux teria encontrado mais apoio para sua posição em um argumento meu de que punir atos antidemocráticos por chefes do Executivo ensina aos outros que eles seriam punidos por atos semelhantes e, assim, torna tais ações menos prováveis. Mas, ao mesmo tempo, aumenta o perigo de que, se ainda tentarem e tiverem sucesso, a sua ditadura seja mais dura. […]

O ex-presidente Jair Bolsonaro. Foto: Isac Nóbrega

Os EUA ainda são uma democracia de fato?

O governo Trump está se envolvendo em todo tipo de medidas de retrocesso da democracia. Suas ações têm o objetivo de debilitar toda oposição política potencial, incluindo na área eleitoral. Trump está atacando escritórios de advocacia, universidades, a mídia e, o mais importante, indivíduos em particular. Está minando a democracia. Ele foi eleito democraticamente, venceu eleições limpas, mas se comporta como um potencial autocrata.

Qual é o impacto para a democracia no mundo?

Não acredito numa crise global da democracia. Vejo uma crise geral da esquerda, da social-democracia. Partidos de extrema-direita estão aumentando o seu apoio na Europa Ocidental e, em alguns países, chegando ao poder. Mas nenhum desses governos, que em alguns casos incluíram partidos que no passado se declararam fascistas, se engaja em atividades de retrocesso.

Mas há retrocessos em países da Europa, como a Hungria.

Hungria, Polônia, Eslováquia em certo momento… Mas são países muito menos desenvolvidos economicamente e não têm tradições democráticas extensas. Na Europa Ocidental, onde os países têm uma renda mais ou menos semelhante e uma longa tradição de alternância pacífica em eleições, não se vivencia o mesmo que nos Estados Unidos. […]

É possível ter uma democracia com valores iliberais, anti-imigração e xenofóbicos, por exemplo?

Temos que aprender a aceitar o fato de pessoas de quem não gostamos vencerem eleições. Desde que sejamos derrotados de acordo com as regras e que tenhamos a chance de vencer a próxima eleição, é democracia. Não é sempre muito bonita, mas é democracia.

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