Supremo desmancha a trama da Câmara para livrar golpistas
Por Raimundo Borges
O Imparcial – Quando se olha para o plenário da Câmara dos Deputados, casa do Congresso Nacional com o papel fundamental de representar o povo brasileiro, legislar sobre assuntos de interesse nacional e fiscalizar a aplicação dos recursos públicos, o que se vê, porém, é um conjunto desafinado, tocando um samba do crioulo doido.
Esta semana, a Câmara aprovou uma medida em forma de parecer, sem debate e sem passar pelas comissões competentes, que suspendeu o processo contra o também deputado bolsonarista Alexandre Ramagem (PL-RJ). Na maior cara de pau, o ex-ministro Juscelino Filho (UB-MA) estava entre os 315 parlamentares que desafiaram o Supremo Tribunal Federal nessa ação de imensa repercussão.
Repetindo a urgência que o tema ganhou na Câmara, também o STF não deixou por menos. Nesta sexta-feira, 09/05, três dos cinco ministros da 1ª Turma deram maioria no julgamento que acabou por desmanchar o atalho da Câmara, que suspendeu a ação penal contra Ramagem, acusado de ser um dos cabeças da trama golpista contra a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a consequente investidura do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O julgamento foi marcado pelo plenário virtual da 1ª Turma, formada por Alexandre de Moraes (relator), Flávio Dino, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Cristiano Zanin. O encerramento da votação está previsto para a próxima terça-feira, dia 13. Mas Moraes e Zanin já votaram contra a manobra.
A decisão da Câmara, comunicada ao presidente do STF, Luís Roberto Barroso, pelo presidente Hugo Motta (Republicanos), foi considerada mais um dos atos que afrontam a Corte. Portanto, exigiu imediato chamamento do relator Alexandre de Moraes para decidir sobre a medida, considerada inconstitucional por juristas e membros do STF, como Gilmar Mendes.
Porém, o que se viu foi a Câmara manobrando para favorecer Jair Bolsonaro, no processo que o ameaça de prisão, ao conceder “anistia” a todos os envolvidos nos atos golpistas de 2023. Ramagem era chefe da Abin, Agência de Inteligência utilizada, de forma criminosa, segundo a PGR, para espalhar fake news e espionar adversários do governo Bolsonaro.
O que resultou na ampla votação da Câmara foi uma orquestração para livrar Ramagem do processo e, por tabela, Jair Bolsonaro, apontado pela Polícia Federal e pela PGR como chefe do projeto de golpe de Estado.
A repercussão sobre a matéria da Câmara foi estrondosa nas mídias eletrônicas. Só o site UOL, em 20 horas, recebeu mais de 140 mil visualizações e milhares de comentários. Muitos deles abordando o voto favorável do deputado Juscelino Filho, até duas semanas atrás ministro das Comunicações do governo Lula, demitido após ser denunciado ao STF pela PGR, por aplicações irregulares de emendas parlamentares em obras que beneficiaram fazendas suas e da família em Vitorino Freire.
E não foi só ele do Maranhão. Dos 18 deputados da bancada federal, coordenada pelo socialista Duarte Júnior, onze votaram a favor da proposta. Até o deputado Josimar do Maranhãozinho e a esposa Detinha, ambos do PL, reforçaram a aprovação, ignorando os rolos que tramitam na Corte contra ele.
Só nos casos de emendas parlamentares, Josimar é acusado em pelo menos cinco crimes: organização criminosa, peculato, corrupção passiva, agiotagem, extorsão e lavagem de dinheiro. Os onze deputados a favor de Ramagem são os bolsonaristas históricos, como Aluísio Mendes (Republicanos), Alan Garcês (PP), Hildo Rocha (MDB), suplente de Roseana Sarney, Josivaldo JP e Pastor Gil, os dois do PL.
Na avaliação de ministros do STF, ouvidos pela Folha de S. Paulo, a anulação do processo pela Câmara pode morrer no nascedouro. Se os ministros bloquearem o atalho engendrado pelos parlamentares, a poderosa bancada dos enrolados em encrencas judiciais no STF, obviamente, pode promover ajuste de contas depois que os ministros encerrarem o julgamento já em andamento.
Seja como for, a crise entre os poderes Judiciário e Legislativo volta e meia acaba trombando com os processos da trama golpista que, por pouco, não pôs a democracia brasileira de cabeça para baixo, como num golpe de Estado ao estilo “república de bananas”.