Quilombolas de Alcântara recebem titulação de Lula
Por Raimundo Borges
O Imparcial – Até o meio dia de ontem, 17, o PT do Maranhão ainda não tinha confirmação da presença do presidente Luz Inácio Lula da Silva, nesta 5ª feira, 19, em Alcântara para ato social de entrega de aproximadamente 350 títulos de propriedade às famílias quilombolas, atingidos pelos impactos do Centro Espacial de Alcântara, antigo CLA. No entanto, a equipe do escalão avançado do Planalto já estava desde 2ª feira em Alcântara, cuidando dos preparativos para a chegada de Lula e uma equipe ministerial.
Caso se confirme a vinda de Lula, ele cumpre uma demanda social que se arrasta desde a desapropriação em 1980, de um imenso território de 52 mil ha para acomodar as instalações do centro de lançamentos.
Alcântara tem um longo histórico de revezes sociais e econômicos insuperáveis, desde o apogeu da cidade nos séculos 18 e 19 até a decadência. Em 1948, o interventor do Maranhão Paulo Ramos transferiu a penitenciária de São Luís para Alcântara e a instalou na antiga Casa de Câmara e Cadeia, um monumento histórico, hoje reduzido a ruínas.
Os presos passaram a andar soltos pelas ruas, afugentando a população pela intranquilidade. Como cidade histórica e rica, por pouco Alcântara não recebeu a visita do imperador D. Pedro II. E a cadeia só foi desativada em 1965, pelo governo José Sarney e transferida para Pedrinhas, em São Luís.
Abandonada, Alcântara viu seu conjunto arquitetônico ser vandalizado, com peças históricas e sacras roubadas de suas igrejas e dos imóveis. Tornou-se uma cidade turística, cujo maior atrativo é o conjunto arquitetônico e a tradicional festa do Divino Espírito Santo – herança do período português.
Estimulado pelas pesquisas que indicavam Alcântara como “melhor lugar do mundo” para lançamentos espaciais em razão de sua geografia está sob a linha do equador, em 1980, no governo militar, foram desapropriados 52 mil ha e expulsas 32 comunidades para agrovilas sem infraestrutura, impactando 300 famílias de pescadores quilombolas.
A questão científica e social virou tema para pesquisadores, roteiristas de filmes, livros e inúmeros estudos sociológicos. Enquanto isso, a Aeronáutica, dona do CLA, construiu seu campo de lançamentos, com inúmeros experimentos de pequeno porte levados ao espaço, ora com interveniência dos Estados Unidos, ora da Ucrânia.
Até a china já demonstrou interesse pelo projeto de Alcântara, atingido pela maior tragédia científica-espacial em 2003, quando toda a estrutura da base explodiu, três dias antes do lançamento do VLS1, matando 21 cientistas e técnico. Foi o suficiente para alimentarteorias da conspiração, de suposto boicote americano ao Centro Espacial.
O regime militar que concebeu o projeto foi extinto, a democracia renasceu, vários governos falaram, apoiaram ou abandonaram o CLA, mas a promessa de resolver as questões dos quilombolas persiste uma demanda cara. Em 2023, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) recomendou que o Brasil titule os territórios quilombolas de Alcântara.
A Convenção 169 da OIT prevê consulta livre, prévia e informada sobre projetos e medidas que afetem povos indígenas e comunidades tradicionais. O presidente Lula, que tem dado atenção como nenhum outro governo a esses povos, vai titular os quilombolas alcantarenses.
Portanto, se vier amanhã, Lula estará cumprindo a primeira recomendação da história no país feita pela OIT, ligada à ONU, sobre comunidades quilombolas, feitas em 2019 contra a violação dos direitos dessas populações, decorrente do CLA. No período, o governo vem tentando ampliar a área de influência do Centro, inclusive com o próprio estado brasileiro reconhecendo a violação de direitos das comunidades.
São várias recomendações da OIT, dentre as quais um comitê tripartite com a presença do governo, trabalhadores e empregadores da área. Enquanto isso, o tema sobre o CLA continua, agora com a construção de um porto em Alcântara e uma ferrovia ligando-o à Norte-Sul. Desta vez, as ruinas de Alcântara ficarão para a história com seu povo respeitado.