20 de maio de 2025
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O que é o projeto de anistia, origem da nova ofensiva de bolsonaristas no Congresso

O projeto que prevê a anista – ou o perdão – a pessoas envolvidas na invasão das sedes dos Três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023 foi a pauta de mais uma manifestação convocada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em São Paulo no domingo (6/4).

A estratégia dos bolsonaristas é de testar o poder do ex-presidente nas mobilizações nas ruas, enquanto pressionam para o projeto ser colocado na pauta da Câmara dos Deputados.

Por isso, durante o ato, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), foi pressionado, sendo chamado de “vergonha da Paraíba” pelo pastor e aliado de Bolsonaro, Silas Malafaia.

Dos Estados Unidos, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) disse, na sexta-feira, que Motta age como “esquerdista do PSOL”, em entrevista à rádio Auriverde Brasil.

“Ele tem falado basicamente igual a um esquerdista do PSOL, falando que é contra anistia, [pela] democracia e aquelas coisas todas que estamos acostumados a ouvir da boca de Lula e de outros puxadinhos do PT.”

Diante das pressões, Motta afirmou que o projeto de lei da anistia não é a “pauta única” do Brasil e do Congresso, enquanto ponderou que é preciso avançar nas discussões sobre supostos exageros nas penas aplicadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

“Defendo dois pontos. Primeiro, a sensibilidade para corrigir algum exagero que vem acontecendo com relação a quem não merece receber uma punição. Acho que essa sensibilidade é necessária, toca a todos nós”, afirmou Motta a jornalistas em um evento em São Paulo nesta segunda-feira (7/4).

“E a responsabilidade de poder, na solução desse problema, que é sensível e é justo, nós não aumentarmos uma crise institucional que nós estamos vivendo.”

Em fevereiro, o presidente da Câmara disse, em entrevista à Globo News, que não admitiria “qualquer flerte com a ditadura”, e lembrou que quem decide a pauta das votações é o Colégio de Líderes, composto por todos os líderes partidários.

“Vamos tratar tudo de forma muito tranquila e de

maneira muito serena. Nosso trabalho será a busca de uma pacificação nacional, de harmonia, para que os Poderes constituídos tenhamos uma pauta de convergência nacional. É isso que o Brasil espera de nós.”

Analistas apontam que, ao colocar o projeto da anistia em votação, Motta compraria uma briga com o Supremo Tribunal Federal (STF), que acabou de aceitar a denúncia contra Bolsonaro, tornando-o réu, junto a outras sete pessoas, por envolvimento em uma suposta trama golpista.

Diante do impasse com Hugo Motta, os aliados de Bolsonaro correm para tentar reunir as assinaturas necessárias para o projeto ser votado com urgência, o que pularia as etapas de discussões nas comissões e levaria a votação direto ao plenário.

O líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), afirmou que vai conseguir as 257 assinaturas necessárias para o requerimento de urgência e ameaçou expor que ainda não havia assinado, por meio da publicação dos nomes daqueles que aderiram ao projeto.

A promessa de Cavalcante era de publicar a lista na manhã desta segunda-feira, algo que, até o fechamento desta reportagem, ainda não havia ocorrido.

Até o momento, a base bolsonarista na Câmara afirma ter conseguido cerca de 180 assinaturas. Por isso, os deputados correm também por outra via, tentando obstruir a pauta para forçar a votação do projeto.

O recurso é utilizado pelos parlamentares para impedir o prosseguimento dos trabalhos e para ganhar tempo, por meio de pronunciamentos, pedidos de adiamento da discussão e da votação e ausência no plenário para evitar quórum para as votações.

Na semana passada, a obstrução do PL foi suspensa para os parlamentares votarem a lei da reciprocidade contra as tarifas anunciadas por Donald Trump. Mas a promessa é de seguir com a obstrução nesta semana.

Motta ressaltou que a obstrução regimental do PL é legítima, mas há outras pautas que interessam ao país. “Vamos tratar as pautas dos outros partidos, não podemos ficar uma Casa de uma pauta só”, disse.

Nesta segunda, Motta afirmou novamente que “Não vamos ficar restritos a um só tema, vamos levar essa decisão ao Colégio de Líderes, vamos conversar com o Senado e com os Poderes Judiciário e Executivo, para que uma solução de pacificação possa ser dada. Aumentando uma crise, não vamos resolver esses problemas, não embarcaremos nisso”.

A manifestação do domingo reuniu 44,9 mil pessoas, segundo o Monitor do Debate Político do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) em parceria com a ONG More in Common. A mesma metodologia contabilizou 18,3 mil pessoas no ato de Copacabana, ocorrido em 16 de março.

Diante de uma eventual condenação, e do fato de já estar inelegível em 2026, Bolsonaro reuniu apoiadores na avenida Paulista, trazendo sete governadores da direita que hoje brigam, justamente, pelo vácuo que o ex-presidente deixará no ano que vem.

Estavam com Bolsonaro os governadores de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), de Santa Catarina, Jorginho Melo (PL), de Mato Grosso, Mauro Mendes (união Brasil), de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), do Paraná, Ratinho Junior (PSD), e de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil).

A ex-primeira-dama, Michelle Bolsonaro, apontada em pesquisas como alguém com certo apelo entre os eleitores na ausência do ex-presidente na disputa, também esteve presente.

Segundo pesquisa realizada pelo instituto Datafolha e divulgada no sábado (5/4), Michelle Bolsonaro teria 15% das intenções de voto, ficando atrás de Lula (35%) e na frente dos demais testados neste cenário:

Ciro Gomes (PDT), com 12%, Pablo Marçal (PRTB), com 10%, Ratinho Junior (PSD), com 5%, Romeo Zema (Novo), com 4%, Eduardo Leite (PSDB), com 3% e Ronaldo Caiado (União Brasil), com 3%. Responderam em branco/nulo ou nenhum: 10%, e que não sabem, 2%.

Michelle Bolsonaro.
Michelle Bolsonaro tem apelo dentro do eleitorado bolsonarista, mas, segundo pesquisa, ainda fica atrás de Lula, com margem ampla

Um relatório do Supremo Tribunal Federal (STF) de janeiro deste ano apontou que 371 pessoas haviam sido condenadas por crimes relacionados ao 8 de janeiro de 2023. Outras 527 teriam admitido a prática de crimes relacionados e feito acordos com o Ministério Público Federal (MPF) para não serem processadas.

Este é o segundo ato pela anistia convocado por Bolsonaro e seus apoiadores. No primeiro, Bolsonaro postou um vídeo com a foto de quase uma dezena de mulheres condenadas por seus envolvimentos no episódio – sem mencionar, contudo, que uma possível aprovação da anistia poderia beneficiá-lo diretamente.

É o que afirmam juristas ouvidos pela BBC News Brasil que avaliaram o projeto. Segundo eles, o texto prevê a anistia para pessoas direta ou indiretamente envolvidas no 8 de janeiro e até mesmo por atos anteriores.

Isso, em tese, beneficiaria Bolsonaro, acusado pelos crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

Mas o que diz exatamente o projeto de anistia e quais as chances de ser aprovado?

A BBC News Brasil questionou juristas, políticos e cientistas políticos para responder a estas perguntas e explicar como a anistia aos presos pelo 8 de janeiro pode, sim, favorecer também o ex-presidente.

A reportagem procurou sua defesa, mas, até o momento da publicação, não houve resposta.

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