Aos 95, Sarney continua fonte de viva inspiração
Por Raimundo Borges
O Imparcial – O sambentense José de Ribamar Ferreira de Araújo Costa, o ex-presidente da República do Brasil José Sarney, chega aos 95 anos (24/04), adotando uma receita simples de vida, mas não tão fácil de pô-la em prática: “Dormir muito, comer pouco e não discutir com mulher”… Em plena lucidez e com a saúde em dia, Sarney continua uma fonte de inspiração, de sabedoria e de simplicidade, como, aliás, é a cultura e a filosofia chinesa taoísta, de onde retirou a frase-síntese de vida.
Ele chega a essa longevidade como uma das figuras políticas mais importantes desde os anos 1950. Os amigos jamais o desprezam, os relutantes repensam seus conceitos e os adversários revisam a posição e passam a reconhecê-lo.
Não se ouve um adversário de José Sarney chamá-lo de traidor. João Batista Figueiredo, último general da ditadura militar de 1964, fugiu pela garagem do Palácio do Planalto, em 15 de março de 1985, para não dar posse nem passar a faixa ao sucessor. Ele chamou Sarney de impostor. Em certa ocasião, ao ser indicado para substituir o general Ernesto Geisel, abriu uma campanha para torná-lo “João do Povo”. Mas ele próprio se encarregou de apagar o lema apelativo.
Perguntado por uma jornalista sobre o que achava do cheiro de povo, ele atalhou: “Prefiro o cheirinho de cavalo…” Ele ainda desdenhava: “A democracia seria muito boa, se não fosse o sovaco” (do povo).
Figueiredo foi o antecessor de Sarney no Palácio do Planalto. Aquele menino que, ao nascer em São Bento, o jornal centenário “Cidade de Pinheiro” fez um curioso registro social sobre o bebê José de Ribamar Ferreira de Araújo Costa, amparado pelas mãos da parteira “Mãe Raimunda”.
Na edição do dia 27 de abril de 1930, o jornal fez uma nota futurista: “O Dr. Sarney de Araújo Costa, nosso digno promotor, esteve com o seu lar feliz em festas no dia 24 deste mês. É que a sua Exma. esposa, D. Kiola, deu à luz o primogênito do casal que, ao nascer, recebeu o nome de José. Os nossos mais sinceros votos ao Criador, para que o inocente José tenha sempre uma vida feliz.”
O ex-deputado Aderson Lago, adversário de Sarney e pai do hoje estadual Rodrigo Lago, gostava de brincar com a expressão retirada do jornal pinheirense: “’O inocente José’ ficou lá mesmo no berço”. O pai, promotor de justiça no interior, foi removido para São Luís, em 1936, onde colocou os filhos para estudar.
Porém, um ano depois sofreu implacável perseguição do interventor Paulo Ramos, que o transferiu para Codó, Coroatá e, em seguida, Santo Antônio de Balsas, no sul do Maranhão, numa viagem que durou sete dias, em 1940. No entanto, as agruras da família acabaram quando retornou para São Luís. Sarney estudou no Liceu e cursou Direito na velha faculdade da Rua do Sol.
É um político contemporâneo, de uma carreira inspiradora. De deputado federal, foi eleito governador do Maranhão, senador, presidente do Brasil, novamente senador pelo Amapá e quatro vezes presidente do Congresso Nacional. Como presidente, Sarney implantou a Constituinte que escreveu a Constituição de 1988.
Segurou a transição democrática num dos períodos mais complicados da história do Brasil. Foi eleito o acadêmico mais jovem da AML, depois tornou-se escritor de quase 30 livros e membro da ABL. Nunca deixou de escrever artigos em diferentes publicações, analisando a política, comentando literatura e fazendo a história no Brasil e fora de suas fronteiras.
Depois que fechou o seu jornal O Estado do Maranhão, Sarney pediu-me para escrever seus artigos semanais em O Imparcial. Eu lhe disse: “Aqui, o senhor tem o seu espaço reservado, afinal, foi n’O Imparcial o seu primeiro emprego”. De fato, Sarney estreou como jornalista aos 18 anos, quando já ensaiava na política estudantil e editava um jornal mimeografado no Liceu Maranhense, já com posição focada no esquerdismo que brotava país afora.
No artigo publicado ontem, 25, em O Imparcial, Sarney pergunta: “Onde está o Papa Francisco?” Na semana em que ele assumiu a cadeira principal do Palácio do Planalto, o jornalista Pedro Freire, diretor-presidente de O Imparcial, colocou em seu gabinete um quadro com a foto: “Nosso repórter que chegou a Presidente do Brasil.”